Francisco
Galindo
Fiquei
sabendo que existe em Minas um lugar chamado Bichinho. O nome oficial é alguma
coisa Veloso, não guardei direito. Ou me permiti esquecer, pois Bichinho já tá
bom. Imagina. Vamos passar lá em
Bichinho, bichinha? Dá pra chegar de triciclo, de pé sempre dá. Como será?
Estradinhas de terra- as coisas não
aparecem do céu, saem é nuas do chão. Um gadinho, suponho. Gatos nos arbustos
olhando a gente e pedindo desculpas pela timidez. Um laguinho pras nossas
momices narcísicas. Casinhas azuis e delicadas. Horizonte bom de espreitar,
como quaisquer horizontes de Minas. Bichinho
tá no catálogo e a gente cata
logo cada porçãozinha que tenha e vai adivinhando silêncio e galos. Céu e
galhos. Esperando por mim e por ti, bichinha, uma casa com pote vestindo xadrez. Uma rede do nosso tamanho, apta de
gangorra e segredos. Um guia com sotaque, dando pasagem: “vá pra onde der
quiser...”
Vitoriano. Vitoriano Veloso. Esse é
o nome engomado de Bichinho. Fica perto de Tiradentes, pelas cintas de São João
D’El Rey. Existe Spoiler turístico? Não o faria, até porque não fui lá. Mas
como não querer ir num lugar que tem uma “Casa Torta” concebida por Renato e
Lu, aberta a brinquedos e cafés, que eu bem me reservo ver peculiar? Uma casa que resolveu não ser direita. Uma
casa retorcida prum duns lados das asas, flexuosa casa de esquerdos. Casa sinuosa, com toque dos ventos. Casa sem
plano, cobiçosa de surpresas. Casa vesga
sem paralelo. Bichinho tem oficinas, tecidos , móveis, decoração, quadros,
paisagismos e jardinagem. Há de ser assim, mas quero pensar que tenha oficinas
de bolhas de sabão e pés de vento. Ela tem mesmo a Oficina de Agosto, criada
pelo artista plástico Antonio Carlos Bech.
Bichinho de verdade é lá urbaninha, enfeitada e polida para arpoar
turista. Pra mim e pra ti, não. Ela que inventou de pegar o nome que
arranjasse pra mim, bichinha, precisa
ter o tamanho do meu e do teu afeto. Não nos dizemos bichinho e bichinha à toa.
Nos chamamos assim só e quando é mesmo pra chamar e mesmo pra
atender, meio bichinhos que ficamos, num cio que aprecio e tu abrecias.
Há nomes pra não se atribuir em vão.
Valem como mimos de quem a gente não “enjoalheria” nunca. Olha só o Mia Couto.
Vem de uma cidadezinha chamada Beira. Não vi, não fui atrás, não deve ser muita coisa,
comparada às prováveis maravilhas de Moçambique. E se juntou beleza ou algum
bem, perdeu prum redemoinho arrogante que a ciclonou e deixou de insulto um “e daí?” Beira
mais do que é, chance de poesia se
exibindo na borda. Há ousadia e gosto para chamar cidades de Lucrolândia e gente que aprove . Mas
existem, ainda em Minas, Entrefolhas, Luz, Carbonita, Divino, Maravilhas, Passatempo. Cidades
podem receber nomes pela numerologia, testados
por repetiçoes, dados por cortesia e
laurel. Mas quando os nomes seduzem no ouvido e ajustam afetos, queremos
ser apresentados, só pra ver como
é que é. Também por isso vamos pra
Bichinho. Por causa do nome que tem e das coisas que pede que a gente não leve,
mas encontre pra arrimar: flanante balãozinho e prece pra São Martinho.
Por causa do nome, vá por
Tiradentes, estique até Prados e mais trinta minutos pela Serra de São josé,
enfim chegará a Bichinho, repetindo as caminhadas em busca do ouro. No
percurso, algumas ruínas e demolições. Para albergar, armazém, santíssimo
resort, solar da serra ou aroma da
montanha. Ou nos iguale, chegue sem ter
ido, bote os pés só de querer, prenda o fôlego e testemunhe que alicolá tem paragem formosa que nem a carícia que nos
fazemos só de bem dizer como nos dizemos.