domingo, 17 de maio de 2020

Que Absurdo



Por Samuel Freitas
Incrível! Não consigo enxergar através das brumas do meu pensamento uma solução para essa existência absurda – principalmente quando deixo de lado meus óculos e me certifico de que ainda sou míope. Mais impressionante é a total falta de escrúpulos que tenho ao admitir que qualquer significado que tentasse dar a vida não passaria de uma apelação, em bem sórdida, em busca de auto consolação.  

Não sei! Talvez se fosse um pouco mais insipiente, tudo seria bem melhor; ou mais confortante. Porém, o que posso fazer? Também acho que poderia, muito bem, assumir o absurdo em mim como prerrogativa inerente do cogito – convenhamos, essa concepção é assaz filosófica para o vulgo. Seria um absurdo viver como um absurdo. Sem caminho; sem diretriz; sem razão para justificar meus preconceitos; sem meios; sem fins; sem amor – Ah! Até tenho a petulância de sentir um ressentimento ao dizer isso assim, tão ríspido –; sem moral; sem convicções... Mas, ademais, as consequências de minha completa falta de recursos imaginários para o percurso da vida são mínimas e irremediáveis, tanto que chega a ser absurda. 

Observes! As consequências às quais me referi já são tangíveis. Olhes meu escrito trêmulo; as frases soltas e abruptas, sem coesão; o desprovimento de nexo e coerência por onde escorrego minha pena. São sintomas da anomalia virulenta que toma cada ser em mim – e na minha ótica, esses seres me governam sem saber dessa enfermidade. 

Eu sou o absurdo, meu caro. Arrasto por ai a existência como o velho Sísifo a vagar com seu inexorável destino. Gostaria que fosse diferente, que a existência me arrastasse mundo afora, mas meu instinto dominador sempre foi mais forte. Portanto, para fins didáticos, o que me tornei foi justamente o que nunca deixei de ser. Calma, serei mais claro (vai levar um esforço incomensurável) dessa vez: Eu, reles humano, sou demasiado eu para mudar-me; ou seja, como causa priori de todo o aparente, estou fadado a mudar todas as coisas em si para todas as coisas em mim, quando bem entender. Tudo é, porque tudo sou. Há fragmentos de mim em tudo o que penso. Que loucura! Dirás com piedade. então que seja o tema principal dessa leitura, direi eu – afinal, deve ser loucura mesmo; já que nem sei o quê, como ou por que peguei a escrever esse pergaminho (...) é uma pena expiatória ter a razão do seu lado quando esta se torna irrelevante para o superego do semelhante. 

Chega de fingir! Tu que tanto se regozijas com suas atitudes honrosas, jogando confetes e soltando ovações; que recitas Drummond; que discursas em botequins; que reprimido fornicas com agressividade; que choras dissimulando uma sincera empatia; que cospes na cruz para poder lustrá-la melhor... Sim tu, impostor de mil faces. Para dessa mania estúpida de fugir de mim. Eu sou tu. Tu és eu. Somos nós os outros; e os outros, nós mesmos. Pode parecer estranho, o que na verdade é, mas é bem mais lógico assim – pelo menos acho. 

E nós que pensávamos em nunca ler aquilo que nem chegamos a escrever, hem? Desculpe-me, acho que me excedi um pouco... por gentileza, mais um drinque!  

Por Samuel Freitas



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