sábado, 25 de outubro de 2008

Valéria Fagundes – A Flor de Cáctus do Sertão, cidade de Manari.









Manari, cidade que em 2002, ficou conhecida por causa do IDH mais baixo do País, fronteira do sertão de Pernambuco, divisa com o estado de Alagoas.
Cenário rústico com um sol causticante, sede e seca... analfabetismo e pobreza rodeados de desprezo político e social. Fatores que impossibilitam o desenvolvimento social e econômico, mas não o suficiente para destoar o talento e arte da menina Valéria, que imune, salvou-se para contar e registrar a história em forma de poesia, crônica e experiência de vida.

Protagonista do documentário “PRO DIA NASCER FELIZ” de João Jardim, que retrata os problemas educacionais vividos por professores e alunos, do Norte ao Sul do Pais, Valéria mostrou ao Brasil seu talento apesar da miséria: o brasileiro só precisa de oportunidades, de atenção e auto-estima.

Em Manari, após a constatação de que a cidade estava com o mais baixo IDH do País, várias medidas governamentais foram tomadas para tentar resolver os problemas sérios de analfabetismo, pobreza e desnutrição. Paralelo às medidas políticas, econômicas e sociais, foi feito o documentário supra citado, filmado na própria cidade que desencadeou noticiários e muitos investimentos em infra-estrutura, educação e saúde.


No meio deste deserto de prosperidade, surge então uma flor em meio aos espinhos, exuberante, propagando perfume de esperança, arte e vida para sua comunidade e o resto do mundo.

Apresentamos Valéria Fagundes em versos e crônicas:










Ainda me emociono quando recordo a escola
Por Valéria Fagundes

Eu sempre vivi de certa forma num universo à parte, numa realidade árdua e por vezes até paradoxal. Mas tenho sobretudo orgulho e demasiado carinho pelo sertão e principalmente pelos seres humanos que ali sobrevivem.

Tenho uma história de vida norteada por desafios e luta constante em favor de uma sociedade mais igualitária. Ainda me emociono quando recordo a escola onde estudei, quando lembro do tempo em que era possível correr, brincar, andar pelas ruas descalça.
Não era proibido vestir a liberdade e nem despir os anseios que se tinha no peito.

Só uma coisa ao certo me entristecia: minha escola não tinha uma estrutura física adequada, havia poucas salas, os professores não tinham muito recurso didático para trabalhar. E mesmo assim alguns conseguiam transmitir o que estava proposto.

Todos os alunos, de dentro das suas salas, podiam ver toda movimentação da rua, a escola era cercada apenas com arame farpado, na hora do intervalo jogávamos bola e comprávamos pirulito numa senhora gorda e mal humorada, os professores faziam piqueniques num único campo de futebol da cidade.

Nesse mesmo período, o Pnud - Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento - apontou Manari como a cidade de menor IDH ( Índice de Desenvolvimento Humano) do país.

A educação é por ventura um dos fatores que acarretam esse resultado vergonhoso. Manari também aparece no documentário "Pro Dia Nascer Feliz" , de João Jardim. Eu, por acaso, também tenho uma pequena participação neste documentário e evidencio, apesar de tudo, a esperança de um mundo mais justo.
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Minha vida tomou um outro rumo depois da participação neste filme, vejo como as pessoas ficam tomadas pela perplexidade quando o assistem, a angústia torna-se algo gritante.
Enquanto crianças e jovens continuam sem a educação, nossos representantes permanecem em seus castelos, cumprindo apenas as etiquetas da corte.
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Hoje tenho 19 anos e estou morando em Recife, trabalho num centro de ensino experimental, numa biblioteca e num espaço de mídia e educação.
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O que me deixa mais feliz é saber que graças ao filme a escola de Manari foi reconstruída. Sei que ainda há muito o que se fazer para mudar esse quadro educacional do país, sei também que a luta não vai ser fácil, mas estou disposta a tirar a educação desse casulo e fazer que ela chegue a todo o povo.
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Às vezes me bate uma saudade do sertão, um desejo de sair pelas ruas e cumprimentar as pessoas, de voltar à escola, rever minha família, meus amigos e professores. Mas lembro-me que é também por eles que estou aqui.

No filme de João Jardim, Valéria diz que seus colegas a acham diferente porque gosta de ler. No inesquecível final, declama um poema feito à maneira da Canção do Exílio de Gonçalves Dias.

Minha terra
Valéria Fagundes

Minha terra por ventura
merece tal descrição
lá a vida é menos dura
qualquer um lhe estende a mão.
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O céu é menos cinzento
lá não tem poluição
só existe um argumento
que me parte o coração.
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Ver o povo madrugar
e seguir para o roçado
mas se a chuva não chegar
perde-se o que foi plantado.
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Eu agora exilada
só me resta descrever
aqui não encontro nada
que me motive a viver.
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Mas falar da minha terra
ah, isso me dá prazer
E mesmo aqui tão distante
tenho algo a pedir.
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Quero agora, neste instante
voltar para Manari
pois eu não quero morrer
sem de lá me despedir.

5 comentários:

Anônimo disse...

Oi pessoal.

Fiquei extramamente feliz ao ver esse texto tão lindo sobre mim,quando eu for pra manarí vou fazer questão de ir conhecer vocês aí em tupanatinga.
Já morei aí também,minha segunda família mora aí.rsrrs

Beijoooo e obrigada pelo carinho

Claudinei Caetano disse...

Muito bom o poema! Lembrei da terra onde passei minha pré adolescência!

Abraços.
http://www.tecnosapiens.com.br

Flavio Costa disse...

Olá Valéria, meu nome é Flavio Costa, sou estudante letras em uma universidade no Rio de Janeiro, já fiz um trabalho sobre você na faculdade, sua história é muito bonita! parabéns. mesmo sem a conhecer já gosto muito.
Acabei virando seu fã!!!

feliza disse...

Olá Valéria, a televisão não é minha primeira opção, prefiro escutar música, mas hoje cedo ao ligar aquele aparelho escutei a chamada sobre a cidade com menor IDH e sentei para assisti o programa. Valéria, me emocionei com tua história, com teu sonho maior. Um sonho cujo foco principal é teu povo, sua educação e melhor qualidade de vida. Valéria, você é uma pessoa iluminada. Desejo que a semente que você plantou em Manarí floresça e dê muitos e muitos frutos.
Iza Figueroa - Belém-Pa

Botelho.m.a1@gmail.com disse...

Valéria sou o Marcos de Jaboatão, linda a poesia combina com tudo da nossa terra.Pernambuco é maravilhoso e rico só falta lutar para melhorar nosso sertão que é de uma gente maravilhosa.Curso geografia peloIFPE e vou divulgar o seu trabalho lá.Parabéns.